No livro
"Introdução à Teologia Sistemática", de Eurico Bergstén, publicado
pela CPAD em 1999, lemos na pg. 270 (pg. 229 da atual edição):
"Os
presbíteros tomavam parte ativa no apascentamento da igreja (cf. At 20.28) e
também no ensino, pois uma das qualidades exigidas do candidato ao presbitério
era que fosse 'apto para ensinar' (cf. 1 Tm 3.2). Os presbíteros constituíam um
corpo auxiliar no governo da igreja, sob a presidência do pastor. Convém
salientar que os ministros também se consideravam presbíteros. O apóstolo Pedro
escreveu para os presbíteros que ele também era presbítero (cf. 1 Pe 5.1), e o
apóstolo João considerava-se ancião (cf. 2 Jo 1) ou presbítero (cf. 3 Jo 1). Apesar
de os presbíteros não serem ministros da Palavra, os ministros,
necessariamente, eram presbíteros. Assim ficava distinguida a liderança que
lhes fora dada por Deus."
Alguns comentários, acerca do referido texto:
1.
Entendo que os presbíteros não constituíam apenas um "corpo auxiliar no
governo da igreja sob a presidência do pastor". À luz do Novo Testamento,
o presbítero poderia ser o próprio pastor, conforme diz I Pedro 5:1-4.
A designação
"pastor", do grego poimen
(ποιμήν), fala-nos da atividade de "cuidar do rebanho",
que envolvia: alimentar, guiar, cuidar (cf. VINE, p. 856, 2003). Dessa forma,
os presbíteros, do grego presbuteros
(πρεσβύτερος), literalmente "homem idoso, ancião, os que
cuidam espiritualmente da igreja" (idem, p. 396, 2003), que assim exerciam
seus presbitérios, eram chamados de "pastor".
2. Não
havia a citada distinção entre "ministros" e "presbíteros".
Os presbíteros eram também ministros. Nem mais, nem menos que isso.
3. O
pastor que "presidia", na realidade, sempre que exercia essa função,
era chamado de "bispo", do grego episkopos
(ὲπίσκοπος), "literalmente, 'inspetor' (formado de epi, 'por cima de', e skopeo, 'olhar' ou
'vigiar', é encontrado em At 20.28; Fp 1.1; 1 Tm 3.2; Tt 1.7; 1 Pe 2.25. (VINE,
p. 434, 2003).
4. Existe
uma aparente dificuldade, no texto aqui questionado. A Declaração "uma das
qualidades exigidas do candidato ao presbitério era que fosse 'apto para
ensinar' (cf. 1 Tm 3.2)", parece entrar em contradição com "Apesar de
os presbíteros não serem ministros da Palavra [...].
5. A Bíblia de Estudo Pentecostal (CPAD) afirma em sua nota sobre "Dons
Ministeriais para a Igreja" que: "Os pastores são aqueles que
dirigem a congregação local e cuidam das suas necessidades espirituais. Também
chamados "presbíteros" (At 20.17; Tt 1.5) e "bispos" ou
supervisores (1 Tm 3.1; Tt 1.17)".
6. Por
fim, na obra "O pastor pentecostal: um mandato para o século XXI",
também publicado pela CPAD, na pág. 110, encontramos o seguinte:
"Alguns
aludem a 1 e 2 Timóteo e Tito como o "Manual do Pastor", por causa
das preciosas instruções e qualificações dadas ao ministério e à igreja. Em 1
Tm 3, há orientações muito específicas a todo aquele que aspira ao pastorado.
Observe a afirmação que segue: "Para efeito de esclarecimento, os
títulos 'bispo', 'presbítero' ou 'ancião' e 'pastor' são usados intercambiavelmente
na Escritura e referem-se ao mesmo ofício, mas expressam responsabilidades
diferentes, como supervisão administrativa, liderança espiritual e ministério,
bem como alimentar e atender o rebanho de Deus. Em Atos 20, todos os três
conceitos - bispo, ancião e pastor - são usados em referência aos líderes da
igreja em Éfeso." (TRASK et ali, p. 110, 1999)
Dessa
forma, parece que tudo fica esclarecido, cabendo, salvo melhor juízo, uma nota
teológica de esclarecimento nas próximas edições de "Introdução à Teologia
Sistemática", de Eurico Bergstén, este que foi um grande baluarte e mestre
das Assembléias de Deus no Brasil.
Parece-nos
que nas Assembleias de Deus no Brasil, as bases teóricas para o entendimento
das atividades ou ofício de presbíteros foram lançadas pelo missionário e
evangelista sueco Nils Kastberg. Araújo, em seu Dicionário do Movimento
Pentecostal escreve que no Mensageiro da Paz de agosto de 1936, Kastberg lança
as bases para um entendimento de que há uma casta ou elite de presbíteros, ao
escrever que “há duas qualidades de presbíteros”. O pensamento de Kastberg veio
a influenciar as resoluções convencionais em torno da questão.
Foi na Convenção Geral de 1937, conforme nos informa Daniel (2004) que ficou estabelecido o ensino sobre a hierarquia eclesiástica que até hoje
existe na Assembleia de Deus: diáconos, presbíteros e ministros do Evangelho
(pastores e evangelistas).
Segundo Araújo (2007), já na Conveção Geral de 1946, realizada na Assembleia de Deus em Recife-PE, foi
aprovado que só poderiam assistir às sessões convencionais “os missionários, pastores e
evangelistas”, enquanto “os auxiliares, presbíteros e diáconos” só poderiam
tomar parte “com a devida recomendação de seus respectivos pastores e sem
direito à votação”.
Dessa forma, estava sacramentada nas Assembleias de Deus no Brasil, a ideia de
que presbíteros e ministros (pastores e evangelistas) não pertenciam a mesma
“classe”, “casta” ou “elite ministerial”.
A ideia de “classe”, “casta” ou “elite” chega ao ponto de fazer com que alguns
presbíteros que dirigem congregações sejam repreendidos pelos pastores e
evangelistas (ministros), quando aceitam ser chamados pela congregação pelo
título de pastor. - Quem lhe consagrou a pastor?
CONCLUSÃO
Entendo que um dos motivos da evolução histórica desta distinção entre
presbíteros e ministros (pastores e evangelistas) nas Assembleias de Deus no
Brasil seja a questão financeira. Como os ministros (pastores e evangelistas)
recebiam ajuda financeira por trabalhar em regime integral (ou parcial), se os
presbíteros fossem “promovidos” ao status de ministros, isso incorreria em ter
que remunerá-los também.
Outro motivo para a consolidação e perpetuação desta ideia equivocada de classe
“superior” e “inferior” de presbíteros no contexto assembleiano, credito a
inacessibilidade dos nossos pioneiros aos recursos bibliográficos, em especial,
às obras nas línguas originais, léxicos, comentários e dicionários bíblicos,
como as temos hoje abundantemente. Acrescente-se a isto toda oposição feita ao
estudo teológico formal por longos anos.
Não encontramos no Novo Testamento, em hipótese alguma, os presbíteros ou
bispos que exerciam o governo na igreja se colocando em posição de domínio ou
superioridade “especial” sobre companheiros os crentes em geral. É neste
sentido que Pedro escreve em I Pe 5:1-4.
Percebam a humildade do apóstolo ao afirmar “sou também presbítero com eles”,
em vez de “sobre eles”. Dessa forma, mesmo que o “anjos” nas cartas às igrejas
da Ásia (Ap 2-3) sejam interpretado como um presbítero-líder, isso não o
colocava em posição de domínio absoluto sobre os demais. As decisões na igreja
do Novo Testamento sempre foram tomadas em conjunto (At 1.15-26; 6.1-6;
15.22-29).
Em 1 Timóteo 3.1-7 temos a prescrição das
qualidades que deveriam ser observadas nos candidatos ao bispado, presbitério
ou pastorado, mas a forma como a escolha era feita não fica clara no texto.
Escrevendo a Tito, Paulo orienta o estabelecimento de presbíteros nas cidades.
Também não é exposto no texto como se dava o processo. Alguns entendem,
fundamentados no contexto do Novo Testamento, que a igreja local participava
ativamente do processo de eleição
À medida que era aumentada a
autoridade dos clérigos (especialmente dos bispos), diminuía a importância e
participação dos leigos. Dessa maneira, a Igreja se tornava cada vez mais
institucionalizada e menos dependente do poder e da orientação do Espírito.
Anselm Grün, monge católico, escreve:
"Só no início do século III
os bispos e presbíteros são descritos segundo conceitos sacerdotais. Desde
Tertuliano e Cipriano, o bispo é designado regularmente como sacerdos
(sacerdote). No ocidente, Orígenes também define o bispo como sacerdote. Ao
mesmo tempo, os presbíteros são chamados de sacerdotes. Depois de Orígenes,
porém, passam a ser sacerdotes num grau inferior. Os presbíteros participavam
do ofício dos bispos. Os diáconos não são incluídos no sacerdócio".
Como se pode observar, a ideia de sacerdotes inferiores fortalecida no século
III, e não no Novo Testamento, é a mesma que norteia a distinção feita nas
Assembleias de Deus entre presbíteros (sacerdotes inferiores) e
pastores/evangelistas (sacerdotes superiores). Ainda sobre a consolidação de
tal conceito no século III, Humberto Almeida, frei católico, afirma que
No fim do século II a Igreja
chega a um ponto de expansão que exige um organograma maior na sua atuação
[...]. Consolida-se a posição do bispo como pastor, com presbíteros seus
“vigários”, prenúncio das futuras dioceses e paróquias.
Como fica evidente com no texto acima, a relação nas Assembleias de Deus entre
os pastores e os presbíteros é a mesma do modelo católico romano entre Bispos e
Presbíteros, distanciado dos parâmetros do Novo Testamento.
Nesta segunda parte de minhas argumentações, entendendo que é quase
impossível uma mudança no sistema assembleiano de governo eclesiástico, e na
forma de conceber o ofício de presbítero. Há, por parte da “classe superior”,
muito poder centralizado e privilégios conquistados envolvidos na questão.
Observações Finais:
Qual a
diferença bíblica entre as atribuições de presbítero, evangelista e pastor?
Nenhuma. É uma questão de foco apenas. O evangelista bíblico seria por
excelência um pregador. Fazemos o seguinte: estágio probatório para o
pastorado. Certo do ponto de vista prático, mas sem apoio bíblico.
Aliás, uma questão subjacente é a tradicional "escada", que não
existe claramente na Bíblia. Qual dos discípulos foi primeiro diácono, depois
presbítero, depois evangelista, e, em seguida, pastor? É complicado responder.
O corpo
ministerial das congregações locais da Igreja primitiva, compunha-se, quase
sempre, somente de presbítero e diáconos, ocupando respectivamente as funções
de supervisão e/ou ensino ("presbíteros") e administração dos bens
temporais (diáconos).
Portanto, concordo que as designações Bispo,
Ancião, Episcopo, Pastor expressam responsabilidades diferentes do ofício do
Presbítero.
Sem nenhum demérito, parecece-me que a escrita do saudoso missionário Eurico
Bergstén é uma tentativa de explicar o jeito assembleiano de constituir a
hierarquizada câmara ministerial, onde o "presbitério" é "corpo
auxiliar".
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA,
Humberto Pereira de. O
sacerdócio e a sua história. São Paulo: Editora Ave-Maria, 2007.
ARAÚJO, Isael de. Dicionário
do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.
BERGSTÉN,
Eurico. Introdução à Teologia Sistemática. Rio de Janeiro: CPAD, 1999.
BÍBLIA.
Português. A Bíblia sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida.
Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2004. Revista e atualizada no Brasil,
2. ed.
Bíblia de Estudo Pentecostal. CPAD.
DANIEL, Silas. História da Convenção Geral das
Assembleias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.
GRÜN , Anselm. Ordem:
vida sacerdotal. São Paulo: Edições Loyla, 2006.
Novo Testamento interlinear
grego-português. Barueri-SP Sociedade Bíblica do Brasil, 2004.
RIENECKER, Fritz; ROGERS, Cleon. Chave
linguística do Novo Testamento grego. São Paulo: Vida Nova, 1995.
TRASK,
Thomas E. et ali. O pastor pentecostal: um mandato para o século XXI.
Trad. Luís Aron de Macedo. Rio de Janeiro: CPAD, 1999.
VINE, W.
E.; UNGER, Merril F.; WHITE JR, William. Dicionário VINE: o significado
exegético e expositivos das palavras do Antigo e Novo Testamento. Trad. Luís
Aron de Macedo. 2. ed. Rio de Janeiro, 2003.