sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O show do milhão de Silas Malafia e Mike Murdock e uma palavra de advertência de David Wilkerson

 
No programa Vitória em Cristo dessa semana, o pastor Silas Malafaia recebeu novamente o pastor Mike Murdock. Segundo anunciado por Malafaia, o programa faz parte de uma série de duas entrevistas, nas quais o pastor norte-americano ensinará “a importância do dinheiro” e também “quatro atitudes para você nunca perder o emprego ou arrumar um”.
 
Eu vi o programa por acaso, estava zapeando os canais da tv, quando dei com a cara do Murdock de novo no programa do Silas Malafaia. Fazia tempo que eu não assistia seus programas. Fiquei nauseado com as palavras recheadas de pura teologia da prosperidade.  Veja as frases murdokianas:
 
"Eu não queria servir a um Deus, que fazia as pessoas pobres";
"Afirmou que daria instruções para dobrar as finanças de seus ouvintes em 12 meses, ou até mesmo mais rápido";
"Depois de começar a seguir as instruções que escreveu na publicação, Deus começou a dar a ele jatinhos particulares e casas pagas. Ele afirmou ainda crer que a pobreza é uma decisão";
"Ao falar sobre as “chaves para o dinheiro”, ele afirma que a pessoa deve “entender o caráter de Deus”: Segundo ele, com esse propósito a pessoa vai entender que Deus quer que ela tenha dinheiro";
"Deus deve uma recompensa financeira às pessoas”;
Finalmente Murdock afirma que "as pessoas “devem fazer negócios com Deus”, para que obtenham a prosperidade financeira. Falando sobre a chamada “lei da semeadura”, o pastor afirmou que uma pessoa não pode comprar um milagre de Deus com dinheiro, mas tem “o direito de pedir uma colheita para toda semente que semear”.
 
Intitulada “Campeões da Fé”, a campanha lançada pelos pastores Malafaia e Murdock, visa levantar 3 mil pessoas para contribuir com o valor de R$1 mil. Em troca das contribuições Malafaia oferece aos que participam da campanha o livro “O Desígnio”, escrito por Murdock. Apesar de determinar o número de 3 mil pessoas, certamente um número bem maior irá contribuir, superando as expectativas dos líderes religiosos em arrecadar R$3 milhões.
 
O pastor David Wilkerson, autor do best seller, "A Cruz e o Punhal", falecido em 2011, era uma voz profética nos Estados Unidos, no vídeo abaixo, denuncia essa teologia e seus expoentes que tanto mal tem feito a igreja evangélica no mundo. Veja e tire suas conclusões:
 
Palavra">http://vimeo.com/84075113">Palavra de David Wilkerson e diagnóstico da loucura que tomou o meio evangélico.
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quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

A falácia da representação evangélica

A verdade é que eu não pretendia tocar no assunto, mas vou aproveitar o gancho para voltar ao tema da representação da igreja na política.
 
As recentes tentativas de criar leis que ferem os princípios cristãos, como a legalização do casamento homossexual e do aborto, com o provável efeito do cerceamento da liberdade religiosa, e o fato de o país ser governado por um grupo que se compraz em incensar os regimes totalitários (em geral inimigos da Igreja) têm levado muitos cristãos a levantar a bandeira da representação evangélica — nas casas legislativas, principalmente. “Se elegermos cristãos comprometidos, essas leis não serão aprovadas, e a nossa liberdade estará garantida”, parece ser o pensamento dominante. Santa ilusão!
 
Ilusão porque essa representação é pura falácia. Para o Reino de Deus, tem a utilidade de uma boia furada. Para começar, os “representantes” não serão eleitos para transformar o Planalto em igreja, nem as câmaras estaduais em casas oração, nem as assembleias legislativas em Assembleias de Deus, mas para fazer política. Porque é isso que fazem os políticos, crentes ou não. Mesmo contra a vontade, em muitas ocasiões os políticos cristãos terão de votar conforme os interesses do partido. E, pelo que me consta, a chamada “bancada evangélica” nem sempre fechou questão quanto aos princípios defendidos pela Igreja, sem falar dos que se corromperam.
 
Além do mais (teoria minha), no que diz respeito às eleições o povo não escolhe: eles simplesmente votam em quem melhor os engana. O mesmo se aplica ao contingente ovino que povoa os nossos templos.
 
O que fazer, então? Humanamente falando, não muito. Voto consciente é quase uma utopia. Candidatos cristãos e capazes são raridade, e nada garante que os crentes irão elegê-los. Portanto, a ideia de que, por sermos um povo numeroso, podemos eleger os “representantes” que quisermos ou mesmo um presidente na prática é uma grande bobagem e até um pecado.
Bobagem porque não há união nem unidade de pensamento entre os evangélicos. Se o povo cristão votou em quem devia, por que o número de nanicos morais no poder só tem aumentado? E por que serão reeleitos? Quarenta milhões de evangélicos são responsáveis por essa situação.
 
Pecado porque estamos esquecendo de que somos Igreja, e as nossas armas são espirituais, não carnais, mesmo quando o assunto é política. Lembram o exemplo de Davi? Ele mandou fazer um recenseamento para medir o seu poderio militar, enquanto o Todo-Poderoso, capaz de destruir qualquer exército com um sopro, era o seu aliado. Pagou caro por isso. Com a Igreja é a mesma coisa.
Agora pergunto: quantos “representantes” a Igreja primitiva tinha no Senado romano? Ela foi perseguida e “desperseguida” e, vale lembrar, só se corrompeu quando o bispo se tornou a maior autoridade (ou “representante”) de Roma. O fato é que em momento algum Cristo prometeu imunidade à Igreja. Sua promessa foi de que ela seria vencedora, não importando de que lado o vento soprasse, e continua assim até hoje.
 
Penso que o receio de uma perseguição à Igreja no Brasil não é sem sentido. Sem sentido é imaginar que a situação pode ser resolvida com um punhado de “representantes”. Com ou sem perseguição, o que a Igreja deve fazer é cuidar dos interesses do Reino. Apenas isso. Em qualquer circunstância. Esqueçam o recenseamento, risquem os cálculos estatísticos, engavetem os planos políticos. Que os pastores politiqueiros criem vergonha e voltem a cuidar do rebanho. Que as ovelhinhas burras busquem a orientação de Deus para não serem mais enganadas. Pastores que pastoreiam e ovelhas que buscam sabedoria: isso é que é Igreja.
 
Comentário: Em um ano eleitoral como esse, o texto maravilhoso escrito em  2010 pelo blogueiro Judson Canto (O Balido), cai como uma luva. Para quem quiser lê-lo na íntegra aqui vai o link: http://judsoncanto.wordpress.com/2010/09/19/a-falacia-da-representacao-evangelica/

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Os Salmos: a anatomia da alma humana


Os salmos constituem uma das formas mais altas de oração que a humanidade produziu. Milhões e milhões de pessoas, judeus, cristãos e religiosos de todas as tradições, dia a dia, recitam e cantam salmos, especialmente os religiosos e religiosas e os padres no assim chamado “ofício das horas”diário.

Não sabemos exatamente quem seus autores, pois eles recolhem as orações que circulavam no meio do povo. Seguramente muitos são de Davi (século X a.C). É considerado, por excelência, o protótipo do salmista. Foi pastor, guerreiro, profeta, poeta, músico, rei e profundamente religioso. Conquistou o Monte Sion dentro de Jerusalém e lá, ao redor da Arca da Aliança, organizou o culto e introduziu os salmos.
Quando se diz “salmo de Davi” na maioria das vezes significa: “salmo feito no estilo de Davi”. Os salmos surgiram no arco de quase mil anos, nos lugares de culto e recitados pelo povo até serem recopilados na época dos Macabeus no século II.a.C. O saltério é um microcosmo histórico, semelhante a uma catedral da Idade Média, construída durante séculos, por gerações e gerações, por milhares de mãos e incorporando as mudanças de estilo arquitetônico das várias épocas. Assim há salmos que revelam diferentes concepções de Deus, próprias de certa época, como aqueles, estranhas para nós, que expressam o desejo de vingança e o juízo implacável de Deus.

Os salmos testemunham a profunda convicção de que Deus, não obstante habitar numa luz inacessível, está em nosso meio, morando como que numa tenda (shekinah). Podemos chegar a Ele, em súplicas, lamentações, louvores e ações de graças. Ele está sempre pronto para escutar.
O lugar denso de sua presença é o Templo onde se cantam os salmos. Mas como Criador do céu e da terra, está igualmente em todos os lugares, embora nenhum possa contê-lo.
Com razão, se orgulhavam os hebreus dizendo: “ninguém tem um Deus tão próximo como nós”! Próximo de cada um e no meio de seu povo. Os salmos revelam a consciência da proximidade divina e do amparo consolador. Por isso há neles intimidade pessoal sem cair no intimismo individualista. Há oração coletiva sem destituir a experiência pessoal. Uma dimensão reforça a outra, pois cada uma é verdadeira: não há pessoas sem o povo no qual estão inseridas e não há povo sem pessoas livres que o formam.

Ao orar os salmos, encontramos neles a nossa radiografia espiritual, pessoal e coletiva. Neles identificamos nossos estados de ânimo: desespero e alegria, medo e confiança, luto e dança, vontade de vingança e desejo de perdão, interioridade e fascinação pela grandeza do céu estrelado. Bem o expressou o reformador João Calvino (1509-1564) no prefácio de seu grandioso comentário aos salmos:
“Costumo definir este livro como uma anatomia de todas as partes da alma, porque não há sentimento no ser humano que não esteja aí representado como num espelho. Diria que o Espírito Santo colocou ali, ao vivo, todas as dores, todas as tristezas, todos os temores, todas as dúvidas, todas as esperanças, todas as preocupações, todas as perplexidades até as emoções mais confusas que agitam habitualmente o espírito humano”.

Pelo fato de revelarem nossa autobiografia espiritual, os salmos representam a palavra do ser humano a Deus e, ao mesmo tempo, a palavra de Deus ao ser humano. O saltério serviu sempre como livro de consolação e fonte secreta de sentido, especialmente quando irrompe na humanidade o desamparo, a perseguição, a injustiça e a ameaça de morte. O filósofo francês Henri Bergson (1859-1941) deu este insuspeitado testemunho:”Das centenas de livros que li nenhum me trouxe tanta luz e conforto quanto estes poucos versos do salmo 23: O Senhor é meu pastor e nada me falta; ainda que ande por um vale tenebroso, não temo mal nenhum, porque Tu estás comigo”.
Um judeu, por exemplo, cercado de filhos, era empurrado, para as câmaras de gás em Auschwitz. Ele sabia que caminhava para o extermínio. Mesmo assim, ia recitando alto o salmo 23: “O Senhor é meu pastor…Ainda que eu ande pela sombra do vale da morte, nenhum mal temerei, porque Tu estás comigo”. A morte não rompe a comunhão com Deus. É passagem, mesmo dolorosa, para o grande abraço infinito da paz eterna.

Por fim, os salmos são poesias religiosas e místicas da mais alta expressão. Como toda poesia, recriam a realidade com metáforas e imagens tiradas do imaginário. Este obedece a uma lógica própria, diferente daquela da racionalidade. Pelo imaginário, transfiguramos situações e fatos detectando neles sentidos ocultos e mensagens divinas. Por isso dizemos que não só habitamos prosaicamente o mundo, colhendo o sentido manifesto do desenrolar rotineiro dos acontecimentos. Habitamos também poeticamene o mundo, vendo o outro lado das coisas e um outro mundo dentro do mundo de beleza e de encantamento.
Os salmos nos ensinam a habitar poeticamente a realidade. Então ela se transmuta num grande sacramento de Deus, cheia de sabedoria, de admoestações e de lições que tornam mais seguro nosso peregrinar rumo à Fonte. Como bem diz o salmista: “quando caminho entre perigos, tu me conservas a vida…e estás até o fim a meu favor” (Salmo 138, 7-8).

Fonte: http://leonardoboff.wordpress.com/

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Integridade não religiosa

Desde a adolescência, organizei a vida a partir de valores da religião. Frequentei e lecionei na escola dominical. Militei em grupos jovens. Me preparei para o exercício pastoral em um seminário. Caminhei pelos bastidores do mundo religioso. Sentei na roda de alguns notórios líderes brasileiros e ianques.
 
Zeloso, sempre procurei cumprir com as exigências das instituições que participei. Se a igreja não permitia que mulheres cortassem o cabelo, briguei com a minha mulher. Se diziam ser pecado ir ao cinema, para evitar a aparência do mal e mesmo não concordando com a proibição, eu viajava para longe quando queria ver algum filme.
Relevei disparates. Calei diante de incoerências. Dei as costas para hipocrisia. Eu considerava a causa de Cristo importante demais. Para não escandalizar, fiz vista grossa para muita ruindade.
Abracei as instituições como divinas e acabei conivente. Não notei o caminho sinuoso do mercenário. Ingênuo sequer me dei conta dos intencionalmente cobiçosos. Justifiquei tolices. Eu acreditei na sinceridade das pessoas. Cheguei ao ponto justificar um monte de bobagem por achar que havia pureza nas intenções.
 
Um eureka aconteceu em minha vida. Embora sincero, eu dava volta, sem sair do lugar. Chego a um tempo de vida que algumas reivindicações da religião perdem seu apelo. Depois de inúmeras decepções, deixei de acreditar na inerente pureza religiosa. Notei que quanto mais bagunçada a interioridade (a alma), mais simétrico o exterior (a aparência). Trato a pregação da santidade absoluta como mistificação. Lembro os malabarismos que testemunhei. Quantos líderes falseavam suas inadequações, projetando em pecadilhos monumentais desvios éticos.
 
Jesus não conviveu ao lado de gente certinha demais. Ao contrário, o Nazareno evitava e criticava quem pretendia cumprir todas as demandas da lei judaica. Ele chamou austeros sacerdotes de sepulcros caiados; tratou mestres como cegos guiando outros cegos. Os evangelistas do templo conseguiam convertidos, mas Jesus afirmava que eles apenas os condenavam a um inferno duplo. O filho do homem, gostava da companhia dos pecadores. Ele se sentia bem perto dos que assumiam a condição humana. Quando alistou apóstolos não se importou com suas inadequações. Pedro era tempestivo; Tomé, hesitante; João, vingativo; Filipe, lento em compreender; Judas, ladrão. Acostumado com os costumes da sinagoga e com o linguajar dos doutores da Lei, ele não buscou discípulos nesses círculos.
 
Jesus aceitou que uma mulher de reputação duvidosa derramasse perfume sobre sua cabeça. Elogiou a fé de um centurião romano, adorador de ídolos. Não deixou que apedrejassem uma adúltera. Mostrou-se surpreso com a determinação de uma mãe cananéia. Nos estertores da morte, prometeu o paraíso a um ladrão. Não mediu esforços ou palavras para enaltecer os diferentes.
Santidade nunca significou para ele a simples obediência de normas. Jesus não tratava um ato igual a uma intenção. Adultério não se restringe ao coito; ele questionava os valores que antecediam o sexo e que podiam ou não desembocar em traição.
O ódio residual, que dá ânsia de matar, é mais grave do que o próprio homicídio. Para Jesus, pecado e santidade participam nas dimensões mais profundas da interioridade humana. Caráter tem a ver com valores escondidos nos porões da alma. Integridade depende de como o ser se estrutura às escondidas.
Para Jesus, santidade e integridade se confundem. Aceitar-se sem panacéias e, sem eufemismo, ser inteiro, eis a receita da perfeição. Sombra, falta, inadequação, defeito, luz e bondade precisam ser encarados sem medo.
 
Deus não requer vidas perfeitinhas. Ele deve saber que a estrutura humana vem do pó. Deus não exige correção absoluta. Para isso, ele teria que converter mulheres e homens em anjos.
Os que vivem a varrer as faltas para debaixo dos tapetes eclesiásticos não têm parte no reino de Deus. As prostitutas, que aprenderam a lidar com suas faltas e defeitos, precedem os sacerdotes bem compostos. O samaritano, que traduziu sua humanidade em gesto de solidariedade, virou o herói da parábola. O tempestivo Pedro recebeu as chaves do Reino de Deus. A mulher, outrora possessa de sete demônios, anunciou a alvissareira notícia da ressurreição.
A lei serviu para mostrar que legalismo não desemboca em humanidade. Integridade equivale ao constante exercício de confrontar as luzes e as sombras que estruturam a alma. Me afasto do moralismo religioso para amadurecer na ética. Fujo do legalismo para recuperar os muitos anos em que corri em círculos. Repenso a espiritualidade porque desejo aprender a viver.