Sábado à noite, dia 21/02, estava em casa quando
recebi uma ligação para ir num velório, pois o genro de uma irmã que congrega na nossa igreja
havia cometido suicídio. Ele não era evangélico, assim como a esposa e filha,
somente a sogra. Pediram para mim fazer um momento de oração e deixar uma
palavra à família. Nunca havia falado em velório de alguém que houvesse
suicidado.
Li o Salmo 90, falando da brevidade da vida e como
devemos pedir a Deus para que nos ensine a contar os nossos dias e alcancemos
corações sábios. Falei que não devemos julgar o destino da alma de ninguém,
pois somente Deus é o Juiz dos vivos e dos mortos, conforme está no livro de
Números capítulo 27. Disse que a Bíblia nos diz é que ao morrer, o corpo volta
ao pó da terra e o espírito volta a Deus. Isso não significa que todas estão
salvos, conforme diz o universalismo, mas sim que todos espíritos humanos estão
sob o controle de Deus. O espírito humano depois da morte física, não fica
vagando por aí, fazendo turismo, como alguém acredita, mas está sob o controle
divino. Como ele não morreu na hora, mas pouco depois e a sogra segurou sua mão
e pediu que ele mesmo em pensamento pedisse perdão a Deus, disse então aos
presentes no velório, que só Deus sabe o que ocorre nas últimas horas, minutos
e segundos de um homem entre a pessa e Ele. Falei então do ladrão na cruz. Depois,
orei pedindo o conforto e consolo do Espírito Santo sobre a família, e que
houvesse naquela hora tão triste, um impacto de conscientização espiritual.
Depois fiquei a pensar na questão do suicídio, como
tem havido casos nos nossos dias, inclusive de pessoas do meio evangélico.
Tirar uma vida é errado, mesmo que seja a nossa. O
suicídio é um ato de ódio contra o “eu”, assim como o homicídio é um ato de
ódio contra outrem. O suicídio é tão errado quanto o homicídio porque viola o
mandamento de amar a si mesmo, assim como o assassinato viola o mandamento de
amar aos outros. O amor se opõe a ambos. O suicídio é um ato egoísta para
terminar nossos problemas sem preocupação em ajudar os outros que também têm
problemas. Tomar o “caminho fácil” para livrar-se do sofrimento da vida não é a
resposta mais amorosa e responsável. O amor nunca perde todo o propósito na
vida. A pessoa que se concentra em proteger e ajudar os outros não tem razão
para odiar a sua vida. Amar é o antídoto à tentação de autodestruir-se.
Tirar uma vida não demonstra amor, mas salvar uma
vida, sim. Jesus declarou: “Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a
própria vida em favor dos seus amigos”(João 15:13). Cristo exemplificou o
princípio de sacrificar a própria vida pelos outros. Ele disse: “Eu dou a minha
vida […] Ninguém a tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou” (João
10:17-18). Portanto, um princípio bíblico de valor que governa nossa vida
pessoal é: O suicídio é errado, mas sacrificar a vida é justificável e nobre
na tentativa amorosa de salvar a vida de outrem.Aos olhos de Deus, um
auto-sacrifício que salva vidas é a suprema expressão do amor de Cristo, a
própria antítese do suicídio egoísta.
Porém, nem todo aparente sacrifício de nossa vida “a
favor de outros” é, um verdadeiro ato de amor. Paulo tornou isto claro no
grande capítulo do amor: “E ainda que eu distribua todos os meus bens entre os
pobres, e ainda que entregue o meu próprio corpo para ser queimado, se não
tiver amor, nada disso me aproveitará” (1 Cor. 13:3). Nem todo mártir morre
necessariamente em conseqüência de uma manifestação de amor a outros. Alguns
podem estar sacrificando vida pelo seu compromisso obstinado com uma causa
egocêntrica. Há vários exemplos de suicídio egoísta na Bíblia. O rei Saul,
mortalmente ferido, caiu sobre a sua espada para poupar-se da vergonha de
morrer às mãos dos inimigos (1 Sam. 31:4), dificilmente um motivo de amor. O
“suicídio assistido” de Abimeleque foi também egoísta e orgulhoso (Juí. 9:54).
Eutanásia e
suicídio assistido
Se o é um ato de amor tirar a própria vida pelo
suicídio, certamente também não é ajudar outrem a cometer suicídio. O amor
exige que os doentes terminais sejam tratados com toda a piedade possível, mas
não que tiremos a vida da pessoa mesmo que ela nos peça. O amor tem um remédio
melhor do que tirar a vida para expressar misericórdia aos agonizantes. Provérbios
31:6 ensina: “Dai bebida forte aos que perecem, e vinho aos amargurados de
espírito”. Em outras palavras, medicamentos para abrandar a dor, sedativos e
tranqüilizantes são a resposta misericordiosa e amorosa aos que estão morrendo
e sofrendo, e não o suicídio assistido. Levar consolo aos que estão morrendo
não só expressa misericórdia, como também reconhece a soberania de Deus que
disse: o Senhor deu, e o Senhor o tomou;
bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21).
A eutanásia e o suicídio assistido, como são
chamados, nunca são manifestações de amor. Mas o que dizer da morte
misericordiosa – permitir que o doente terminal expire em paz sem nenhuma
intervenção heróica e não natural? A Bíblia não obriga o cristão a perpetuar a
vida o mais possível. Nosso ponto de vista deve ser o de preservar a vida, e
não prolongar a morte. Injetar medicamentos para causar ou apressar a morte é
uma coisa – e algo também moralmente errado.
O princípio de valor que se aplica aqui é: Tirar a
vida de outrem em nome da piedade não é uma manifestação de amor mas permitir
que uma pessoa com uma doença terminal morra naturalmente demonstra piedade e
amor.
O que a Bíblia diz
sobre o suicídio?
Paulo disse que sofreu tantas angustias na Acaia que esteve
a ponto de “desesperar da própria vida”. Estamos falando de Paulo, o apostolo,
o mesmo que viu a Luz na Estrada e que conheceu o amor de Deus como muito pouca
gente jamais sonhou em conhecer.
Ora, Paulo não era esquizofrênico; não tinha nenhuma
Desordem Bipolar; não sofria de depressão; não era acossado por nenhuma
Síndrome do Pânico; não tinha nenhum tumor maligno pressionando seu cérebro;
não era enfermo de nada que fosse essencial; e não sofria de nenhuma forma de
doença mental que pudesse lhe fazer ter impulsos incontroláveis e ou à revelia
— como muitas vezes acontece com pessoas que se suicidam.
A menos que você me diga que um “salvo” não sofre de nenhum
desses males (o que seria um terrível equivoco, com danos irreparáveis no papel
de um pastor em relação aos que sofrem) — a implicação de não poder negar essa
possibilidade conduz imediatamente à seguinte conclusão:
É possível que
uma pessoa que sofra tais perturbações possa ficar em tamanho estado de
desespero, que venha a praticar um ato suicida como quem busca a morte como
“esperança”. Creio que quem se mata em razão do desespero da
presente existência, e o faz na esperança de uma vida pós-morte, de fato se
mata, embora não esteja se suicidando.
O suicida
é aquele que não tendo pulsões provocadas por nada interno ou externo a si
mesmo, mata-se por uma total descrença nesta ou em qualquer outra vida.
Os demais são coitados buscando alivio e vida, não morte.
Portanto, o suicídio não deve ser nunca objeto de juízo humano, pois, de fato,
ninguém sabe quem, matando-se, suicidava-se.
Além disso, como a Bíblia não “teologiza” sobre o tema,
tem-se mais uma razão para não especular. Afinal, trata-se de “terra santa”, na qual se deve entrar
sem as sandálias das falsas
certezas e das muitas presunções. Ante um suicida inerte dentro de um caixão, tem-se que apenas calar. Porque
qualquer fala, juízo ou interpretação acerca do tema pode nos fazer incorrer no
risco de blasfêmia contra a vida humana!
De fato, qualquer das causas físicas e psicológicas por mim
mencionadas no início, por si mesmas já possuem o poder de levar uma alma
adoentada ou um cérebro adoecido, ao desespero do suicídio.
“Crentes”
podem sofrer de tudo o que qualquer pessoa sofre nesta vida. Ou
então me diga qual é a área da vida que um “crente” recebeu licença divina de
não experimentar. É claro (mais que claro) que uma mente que esteja normal e
bem fixada na fé, não apela para o suicídio apesar dos desesperos da presente
existência.
Do mesmo modo
que uma pessoa sadia na mente e na fé não apela para um monte de coisas que se
vê os “crentes” apelarem todos os dias. Portanto, o suicídio deve
ser sempre combatido em razão da esperança e da promessa da vida já AQUI, mas
nunca deve ser tratado como ato de auto-perdição ou de pecado imperdoável
contra os céus.
Na realidade a percepção que muitos crentes tem acerca do
suicídio é “católica”; e foi desenvolvida nos porões escuros da “Igreja” nos
anos chamados de “Idade das Trevas”. Na Idade Média, o suicídio de escravos foi
condenado no concílio de Arles, no ano 452. Mas, já em 348, o Concílio de
Cartago condena a morte voluntária (Minois, 1998). Segundo Minois (1998), em
381 o Bispo de Alexandria decide não mais fazer orações para aqueles que
tiraram, espontaneamente, a vida. Entretanto, foi apenas em 533, no Concílio de
Orléans, que foi proibido às honras fúnebres e no concílio de Bragança, em 563,
que a Igreja Católica considera o suicídio equivalente ao homicídio. Já em 693,
no concílio de Toledo, advoga a excomunhão para aqueles que sobrevivessem ao
ato suicida. Posteriormente, a partir de 1284, a Igreja proíbe o enterro de
suicidas em terras sagradas ou cemitérios (Alvarez, 1999; Rosen, 1975; Minois,
1998). Segundo Eliade (1999), para as culturas religiosas, as cerimônias
funerárias têm a função de conduzir, por meio de ritos, ao seu destino
post-mortem auxiliando a alma a ser aceita na comunidade dos mortos. Assim, ao
negar os ritos fúnebres ao corpo do suicida, conclui-se que a Igreja não
conceberia que a alma do suicida pudesse ter um bom destino. Isso não ocorre
mais, pois hoje a própria Igreja Católica em seu último catecismo, apesar de
declarar como errado tirar a própria vida, orienta os fiéis a rezarem pela alma
da pessoa.
A ênfase da Escritura é em não matar os outros, mas não
fala do ato de auto-morte em razão da dor. Assim, no que Jesus fez silencio e
no que as Escrituras ficam caladas, quem ousará condenar quem quer que seja?
O
trabalho de um pastor é fazer prevenção de todo ato de morte. Entretanto, isso
tem a ver com a vida AQUI, mas não deve se estender para trazer juízo
relacionado à vida ALÉM.
O suicídio é normalmente definido como o ato de tirar a
própria vida. As cicatrizes emocionais deixadas na família e amigos são
profundas e produzem não apenas sentimentos de solidão, mas particularmente
senso de culpa e desnorteamento.
Temos primeiro de distinguir entre suicídio e martírio, que
é a disposição de dar a própria vida por convicções fundamentais consideradas
inegociáveis, e atos heróicos de auto-sacrifício que resultam na preservação de
outras vidas (por exemplo, um soldado lançando-se sobre uma granada para salvar
outros). Conquanto o suicídio seja essencialmente uma negação do valor da vida presente e a solução
extrema para uma existência tida como insuportável, os demais casos são
expressões de respeito e amor à vida.
Vou relacionar os
casos ou tentativas de suicídio registrados na Bíblia, extrair algumas
conclusões e então fazer comentários gerais.
1. Casos
de suicídio na Bíblia: Abimeleque, ferido mortalmente por uma pedra de
moinho lançada contra ele por uma mulher, pediu ao seu escudeiro que o matasse
para evitar a vergonha (Juízes 9:54). Saul, depois de haver sido gravemente
ferido em batalha, tirou a própria vida (I Samuel 31:4). Vendo o que o rei
fizera, seu escudeiro “jogou-se também sobre sua espada e morreu com ele”
(verso 5, NVI). Essas mortes foram motivadas pelo temor daquilo que o inimigo
lhes poderia fazer. Aitofel, um dos conselheiros de Absalão, enforcou-se depois
de saber que o rei rejeitara seu conselho (II Samuel 17:23). Zinri tornou-se
rei depois de um golpe de Estado, mas ao perceber que o povo não o apoiava, foi
“à cidadela do palácio real e incendiou o palácio em torno de si e morreu” (I
Reis 16:18, NVI). Judas ficou tão desorientado emocionalmente depois de haver
traído Jesus, que acabou se enforcando (Mateus 27:5).
Sansão se
suicidou?
Alguns consideram Sansão um
exemplo de suicídio (Juízes 16:26-31), mas o seu objetivo era matar os
filisteus e não a si mesmo. Sansão tirou a própria vida e a de muitos
proeminentes inimigos ao fazer com que um edifício todo ruísse (Juízes
16:29-30). De fato Sansão se
matou, mas não se suicidou. Matou-se porque dele veio a decisão de derrubar o
Templo e morrer no desastre. Entretanto, sua motivação era de vida e esperança
de libertação — pois cria que aquele ato poderia trazer livramento para o seu
povo por algum tempo.
O impacto moral do
suicídio deve ser avaliado segundo a compreensão bíblica da vida humana: Deus
criou a vida, e nós não a possuímos para usá-la e descartá-la como bem
entendermos. O sexto mandamento também tem alguma coisa a dizer sobre o
assunto. Um cristão, portanto, não deveria considerar o suicídio como solução
moralmente válida para o infortúnio de viver num mundo onde existe dor física e
moral.
Como devemos reagir
diante do suicídio de alguém a quem amamos? Primeiro, a psicologia e a
psiquiatria têm revelado que o suicídio geralmente é o resultado de um profundo
transtorno emocional ou desequilíbrio bioquímico associado a um profundo estado
de depressão e medo. Não deveríamos julgar as pessoas que optaram pelo suicídio
sob tais circunstâncias. Segundo, a perfeita justiça de Deus leva em
consideração o impacto que nossa mente perturbada tenha eventualmente sobre
nós; Ele nos compreende melhor que do que qualquer ser. Devemos colocar o
futuro de nossos queridos em Suas mãos de amor. Terceiro, com a ajuda de Deus,
podemos encarar a culpa de uma maneira construtiva, tendo em mente que muitas
vezes aqueles que cometeram suicídio necessitavam de ajuda profissional que nós
mesmos fomos incapazes de proporcionar.
Finalmente, se você
alguma vez for tentado a cometer suicídio, saiba que há profissionais
disponíveis, medicamentos que podem ajudá-lo a superar a depressão, amigos que
o amam e fariam todo o possível para ampará-lo, e um Deus que está disposto a
trabalhar por você e, por meio de outros, dar-lhe forças quando caminhar pelo
vale da sombra da morte.
Nunca perca a
esperança!