D a n i e l é um dos maiores
exemplos de oração que temos na Bíblia. Ele ora com seus amigos, e
os magos são poupados da morte (Dn 2.17,18). Ele ora com as janelas abertas
para Jerusalém, e Deus o livra da cova dos leões (Dn 6.10). Ele ora confessando
seu pecado e os pecados do povo, pedindo a restauração do cativeiro babilônico
(Dn 9.3). Agora, Daniel ora novamente em favor de sua nação (Dn 10.1-3).
Esse
texto tem muitas lições importantes a nos ensinar sobre oração e jejum. Também
nos fala dos reflexos que as orações da igreja produzem no céu. Esse texto
ainda nos ensina grandes lições sobre batalha espiritual. Vejamos algumas lições
sobre as marcas de um intercessor amado no céu:
Recebe
o fardo do seu povo sobre os ombros (Dn 10.1-3) Daniel é um homem de lágrimas.
Ele chora pelo povo (v. 2). Esse é o terceiro ano do reinado de Ciro. Daniel tem
aproximadamente 84 anos, já é um ancião. Ele orou, chorou e jejuou pela libertação
do cativeiro. Agora o povo está em Jerusalém, mas, sob fogo cruzado. A oposição
dos samaritanos interrompeu a construção do templo. O povo voltou, mas a
restauração plena ainda não aconteceu. Daniel, contudo, mesmo distante, aflige
sua alma e chora pelo povo. Os fardos do povo de Deus precisam pesar em nosso
coração. Jamais seremos verdadeiros intercessores a não ser que sintamos o peso
das aflições do povo sobre nossos ombros. Daniel jejua e ora pelo povo (v.
3,12). Ele se abstém de alimentos. Daniel deixa por 21 dias o convívio social e
se recolhe para um tempo de quebrantamento, jejum e oração em favor de sua nação.
Muitos judeus preferiram ficar na Babilônia a voltar a Jerusalém. Daniel, porém,
não voltou por causa de sua idade e também porque na Babilônia podia
influenciar mais profundamente os reis persas. Mas durante os setenta anos de
cativeiro, mesmo ocupando altos cargos, nunca se esqueceu de Jerusalém. Diariamente,
orava pela cidade (Dn 6.10).
Recebe
especial visitação do céu (Dn 10.4-12). Daniel recebe uma visitação
angelical. O anjo que o visita é cheio de esplendor (v. 4-6). Alguns estudiosos
como Stuart Olyott, Evis Carballosa e Young entendem que a descrição desse anjo
é uma teofania e trata-se da segunda Pessoa de Trindade. A razão
apresentada é que a descrição é muito semelhante àquela apresentada em
Apocalipse 1.13-17. Também entendem que só a presença de Jesus provocaria tanto
impacto em Daniel, e só o Senhor pode tocar e restaurar vidas.
Outros estudiosos, porém, como Calvino, Osvaldo Litz e Ronald Wallace entendem que a descrição é mesmo de um anjo, sobretudo, porque no versículo 13 há resistência em relação a esse anjo, e ele precisa de reforço espiritual. As descrições do anjo são magníficas e muito parecidas com a aparição gloriosa de Jesus a João, na ilha de Patmos: sua vestimenta (v. 5); seu corpo (v. 6); seu rosto (v. 6); seus olhos (v. 6); seus braços (v. 6); seus pés (v. 6) e sua voz (v. 6).
Daniel,
diante do esplendor do anjo, reage de três formas diferentes (v. 7-12). Em
primeiro lugar, ele tem claro discernimento (v. 7). Apenas Daniel conseguiu discernir
a voz do anjo. Os outros ouviram, temeram e fugiram, mas apenas Daniel
compreendeu. Foi assim também com Saulo de Tarso no caminho de Damasco (At 9.7;
22.9). Apenas aqueles que vivem na intimidade de Deus discernem a voz de Deus.
Houve uma irresistível percepção do céu na terra. Ao fugirem os demais, Daniel ficou
sozinho perante o anjo do Senhor.
Em
segundo lugar, ele passou por profundo quebrantamento (v. 8). Quando
Daniel ficou sozinho diante do ser celestial, seu corpo enfraqueceu. Daniel cai
prostrado diante do fulgor do anjo. Diante da manifestação da glória de Deus os
homens se prostram e se humilham. A glória de Deus é demais para o frágil ser humano
suportar.
Em
terceiro lugar, Daniel experimentou gloriosa consolação (v. 12). O Daniel que
está prostrado ouve, agora, palavras doces e encorajadoras. Ouve que é amado no
céu (v. 11). Toma conhecimento que suas orações foram ouvidas (v. 12). Ouve que
o que é ligado na terra é ligado no céu. Ouve que Deus aciona Seus anjos para atender
Seus filhos quando esses se pôe de joelhos em oração (v. 12b). Por isso, Daniel
não deve ter medo (v. 12).
Recebe resposta às suas orações (Dn 10.12,13). A
resposta à oração de Daniel foi imediata (v. 2). Daniel aplicou o coração para
compreender e para se humilhar diante de Deus. Nós temos feito sso? Hoje as
pessoas que julgam compreender querem ser grandes. Daniel queria ter luz na
mente e oelhos dobrados. Os teólogos deveriam ser os homens de coração mais quebrantado.
Daniel é informado que sua oração foi deferida logo que ele começou a orar.
Deus tem pressa em responder àqueles que clamam a Ele. A resposta foi também
imediata (v. 12b). Deus não apenas respondeu a oração de Daniel, mas destacou
um anjo para trazer a resposta a ele. Os céus se movem para atender a igreja.
Os anjos são espíritos ministradores em favor dos que herdam a salvação (Hb
1.14). A resposta à oração de Daniel foi resistida pelo príncipe do reino da Pérsia
(v. 13). Deus levanta a cortina e mostra para Daniel que há dois andares no
mundo: o físico/material e o espiritual. Muitas vezes, só enxergamos as coisas
no plano físico. Mas sobre nossas cabeças desenrolase outra cena, uma batalha
espiritual, no mundo invisível, espiritual. Há guerra espiritual entre os anjos
de Deus e os anjos do mal. Enquanto a igreja ora, trava-se uma batalha nas regiões
celestes.
Recebe discernimento dos propósitos de Deus na história
(Dn 10.14). Daniel recebeu uma longa revelação a respeito do futuro e
contempla o que há de acontecer ao povo de Deus (v. 14). A visão se estende não
apenas aos anos imediatamente posteriores; mas até ao fim do mundo. A revelação
será detalhada em Daniel 11 e 12. Essa revelação registra fatos que
cobrem toda a história. Deus conhece e revela o fim a Daniel. Deus é o Alfa e o
Omega da história. Daniel também recebe discernimento quanto à batalha
espiritual (v.13,20). Edward J. Young entende que a referência ao “príncipe do
reino da Pérsia” tem que se relacionar com um ser sobrenatural, já que se trata
de uma batalha espiritual. Leupold defende essa mesma tese de uma
batalha espiritual.João Calvino, entretanto, advoga a tese de que esse
texto não está falando de uma batalha espiritual. Para Calvino, esse príncipe
do reino da Pérsia é Cambises.
Nessa batalha há uma terrível hostilidade a ser enfrentada.
O anjo fala com Daniel sobre a batalha travada nas regiões celestes. Há resistência
espiritual às orações dos santos. Paulo diz que “náo é contra carne e sangue
que temos que lutar, mas sim contra os principados, contra as potestades,
contra os príncipes do mundo destas trevas, contra as hostes espirituais da
iniqüidade nas regiões celestes” (Ef 6.12). Muitos acontecimentos na terra são
reflexo dos acontecimentos no mundo espiritual. Mas há também um ajudador
celestial (v. 21). Miguel é o arcanjo, defensor do povo de Deus (Dn 12.1). Seu nome
é citado cinco vezes na Bíblia (uma vez em Judas, uma vez em Apocalipse e três
vezes em Daniel).
Recebe o toque especial do céu (Dn 10.10-19). Daniel
recebe três toques especiais de Deus. Em primeiro lugar, recebe o toque para se
levantar (v. 10-14). O anjo do Senhor toca em Daniel. Ele estava prostrado com
o rosto em terra e enfraquecido. Deus o levanta por meio de Sua voz e de Seu
toque. Mas o que pode levantar esse homem? Saber que é amado no céu (v. 11);
saber que os céus se movem em resposta a suas orações (v. 12); saber que
o futuro está nas mãos de Deus (v. 14).
Em segundo lugar, recebe o toque para abrir a boca e falar
(v.16,17). Daniel é tocado nos lábios como Isaías. Quando é tocado, ele sente
dores (como de parto). Ele se sente fraco e desfalecido. Apenas aqueles
que se quebrantam diante de Deus têm poder para falar diante dos homens. Daniel
está extasiado diante do fulgor da revelação do anjo que o tocou (v. 17).
Apenas podem falar com poder aos homens, aqueles que ficam em silêncio diante
de Deus.
Em terceiro lugar, recebe o toque para ser fortalecido (v.18-21).
O anjo de Deus toca Daniel agora para o fortalecer. O anjo lhe diz: “Não temas”
(v. 19). O anjo reafirma que ele é amado no céu (v. 19). O anjo ministra paz àquele
que está aturdido por causa do fulgor da revelação. Duplamente o anjo lhe
encoraja: “Sê forte, e tem bom ânimo”. Concluindo, podemos identificar com mais
clareza a natureza dos nossos verdadeiros inimigos, aqueles que se opõem à obra
de Deus. Não eram apenas os desencorajadores ou os samaritanos que se opunham à
obra, nem mesmo os reis persas que atenderam aos samaritanos, mas, sobretudo,
os anjos caídos (v. 13,20). Nossa principal guerra não é contra o desânimo nem contra
os homens, mas contra os principados e potestades. O apóstolo Paulo diz que os
homens não crêem porque o príncipe deste mundo cega o entendimento dos incrédulos
(2Co 4.4).
Esse precioso texto nos ensina, outrossim, sobre as armas apropriadas
para vencer esse conflito. Para ter vitória nesse conflito precisamos nos
entregar à oração, ao jejum, ao pranto e ao quebrantamento. Precisamos
discernimento para entender a luta que se trava no mundo visível e também no
invisível. Como Daniel, precisamos entender que há poder de Deus liberado por
meio da oração. Precisamos continuar orando, mesmo que a resposta demore a
chegar até nós, não obstante, já ter sido deferida no céu.
Bibliografia: Daniel: um Homem amado no céu. Hernandes Dias Lopes. São Paulo, SP: Hagnos, 2005.