sexta-feira, 1 de julho de 2011

A DENÚNCIA DO PROFETA

Gosto de ler o livro de Amós. É significativo evocar o profeta Amós, camponês que se tornou autor bíblico. "Sou vaqueiro e plantador de sicômoros", definia-se ele (7,14). Viveu há vinte e oito séculos, em Técua, num sítio próximo a Belém da Judéia. Israel era governado pelo rei Jeroboão II (786-746 a.C.), cuja política econômica consistia em aumentar a carga tributária, extorquindo sobretudo os assalariados e diaristas, para favorecer as importações, endividando o país. O Estado era rico e o povo, pobre. Pesquisas arqueológicas revelam que, quanto mais endinheirada a nobreza, mais suntuosos os palácios da Samaria, em contraste com a miséria dos casebres da população.

Versado em política e relações internacionais, graças ao trabalho de comercializar queijos, lã e couro nos principais mercados da região, Amós deixou o reino do Sul, onde vivia, e dirigiu-se ao Norte. Indignado frente a tanta desigualdade, denunciou os que "vendem o justo por dinheiro e o necessitado por um par de sandálias" (2,6), ou seja, juízes e fiscais que aceitavam subornos para aplicar multas que resultavam no confisco da terra dos camponeses."

Pai e filho dormem com a mesma mulher" (2,7), vociferava o profeta contra os patrões que transformavam suas empregadas em prostitutas. Os governantes "em seus palácios entesouram violência e opressão, e não sabem viver com honestidade" (3,10).O tempo e os recursos que as mulheres ricas perdiam no cuidado da vaidade levaram Amós a apelidá-las de "vacas de Basã", que "vivem em casas de marfim nos montes da Samaria, oprimem os fracos e maltratam os necessitados" (4,1).

As autoridades e os juízes "transformam o direito em veneno e atiram a justiça por terra" (5,7), "odeiam os que defendem o justo no tribunal e têm horror de quem fala a verdade" (5,10). Os trabalhadores "pagam pesados impostos, constroem casas de pedras lavradas nas quais nunca irão morar e plantam vinhas de ótima qualidade sem jamais saborearem o vinho" (5,11).

Primeiro profeta a assinar um livro da Bíblia, Amós não fazia rodeio com as palavras. Denunciava os abastados que "deitam-se em camas de marfim, esparramam-se em cima de sofás, comendo cordeiros do rebanho e novilhos cevados em estábulos, cantarolam ao som da lira, bebem canecões de vinho e usam os mais caros perfumes" (6,4-6). No comércio, "diminuem as medidas, aumentam o peso e viciam a balança" (8,6). Os agiotas, "no templo de seu deus bebem o vinho dos juros" (2,8).Ainda assim, a elite revestia-se de uma religiosidade exuberante. 

O profeta, entretanto, não se deixava iludir e Deus falava por suas palavras: "Detesto as festas de vocês, longe de mim o ruído de seus cânticos, nem quero escutar a música de suas liras. Eu quero, isto sim, é ver brotar o direito como água e correr a justiça como riacho que não seca" (5,21-24).

Amós criticava aqueles que enchiam a boca de discursos políticos e religiosos e, no entanto, permaneciam indiferentes ao sofrimento do povo. Para ele, tudo aquilo era "tão absurdo como arar o mar com bois ou encher de pedras a pista e esperar que os cavalos corram" (6,12). Como se vê, a mensagem do livro do Profeta Amós, continua atual.

8 comentários:

  1. Juber, toda vez que leio Amós penso a mesma coisa. Não somos chamados simplesmente para viver um evangelho assistencialista apenas, mas não podemos ficar indiferente diante de tanta injustiça que o nosso povo enfrenta.
    O que dizer quando a maior parte dos deputados evangélicos votam para aumentar seus honorários em 60% e essa mesma maioria vota contra um salário minimo um pouco mais digno para grande parte da população.
    O que falar dos pastores que empregam grande parte da renda da sua igreja com luxo desnecessário em seus templos e deixam fechar a congregaçãozinha da periferia por falta de dinheiro do aluguel do salão.

    Em Cristo,
    Jony

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  2. Caro pastor Jouber, eu não sei se é por ser um "evangélico" há pouco tempo, mas o fato é que nunca vi, nem em púlpito, nem na mídia um pregador sequer fazer menção a qualquer versículo do livro de Amós, e a mesma percepção tenho também em relação aos sermões dos padres católicos. Seria o livro de Amós considerado de uma forma velada um livro "espúrio", porque no fundo ele trata do principal drama humano desde sempre? Sabemos que padres e pastores torcem o nariz para os problemas humanos, em outras palavras, eles realizam o caminho inverso ao traçado por Jesus em seu Ministério terreno, pois Ele ia ao encontro do homem e seus problemas, atendia a todos, mas sempre levava em conta os problemas que os afligiam, diferentes dos "profetas" atuais que fazem de tudo, principalmente para se distanciar do homem comum, principalmente dos seus problemas. Já tinha lido o livro de Amós há cerca de dez anos atrás, sem a percepção que o pastor Jouber tem e que eu passo também a ter. Começo a pensar que Amós antecipou as críticas hoje tão necessárias especialmente às estrepolias de lideranças teleevangélicas e/ou midiáticas que fazem muito barulho para aparecerem e até com a pretensão de poder político (Deus me livre!), enquanto o povo, agora, como antes, "vagam, como ovelhas sem pastor". Graça e Paz.

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  3. Infelizmente hoje e o meio evangelico nao fica de fora é o seguinte:estando bem eu e minha familia o resto que se dane se vire.Totalmente o inverso que Jesus ensinou.

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  4. Juber, neste excelente texto vc aborda outro ponto importante na explicação da crise que se abate sobre a "mocidade" - como escreveu o Gutierres, citado por vc hoje: a falta de envolvimento ético na vida sócio-político-econômico-espiritual do brasileiro. Só "ser santo" e "pregar o evangelho" não basta!!!

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  5. Jony,

    São muitas as contradições mesmo, e é preciso como Amós ser uma voz profética no sentido de denúncia como eram os profetas do Antigo Testamento e não nas "profetadas" como se vê por aí.

    Um abraço.

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  6. Professor Moacir,

    As citações nas pregações sobre Amós são meio raras mesmo, mas já tive oportunidade de ler e ouvir algumas. A mensagem do livro do profeta continua atual, tanto na denúncia dos abusos sociais-econômicos da classe dirigente do país como dos praticados pelos líderes religiosos.

    Obrigado pela sua participação.

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  7. Webstter,

    Vivemos numa sociedade onde o individualismo é reinante com suas exceções é claro. Isso tanto no mundo secular como na igreja. Infelizmente, as pessoas foram ensinadas até nas orações a pensar individualmente e não no coletivo, por isso se ora mais como "Meu Deus", do que "Pai nosso".

    Abraço.

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  8. Rubinho,

    Não sei porque mas seu comentário foi salvo nesta postagem. Vou responder a ele na postagem sobre a "crise da mocidade assembleiana".

    Abraço.

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