O artigo 80 da Constituição não deixa muita dúvida. Reproduzo o texto aqui de todo modo: “Em caso de impedimento do presidente e do vice-presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal”.
Na tarde de ontem, o Supremo decidiu, por seis votos a três, que, na condição de réu sob a acusação de peculato, o presidente do Senado, Renan Calheiros, não poderá ocupar a Presidência da República – mas poderá continuar no cargo. Pela decisão de ontem, em caso de ausência do presidente Michel Temer e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o artigo 80 não será cumprido.
O Supremo pode ordenar que um artigo da Constituição não seja cumprido? Como tribunal constitucional, o STF interpreta a lei como entende melhor. A interpretação de ontem se baseou não no que está escrito, mas no juízo subjetivo sobre as consequências da decisão.
A escola jurídica conhecida como "originalista" acredita ser papel da mais alta corte decidir com base no que está literalmente escrito na Constituição. Nos Estados Unidos, o maior expoente dessa escola em tempos recentes foi o juiz Antonin Scalia, morto este ano. Lá, originalistas tiveram papel determinante em casos cruciais, como o direito ao porte de armas ou o financiamento de empresas a campanhas eleitoriais.
Nos Estados Unidos, opõe-se ao orginalismo a noção de uma “Constituição viva”, interpretada de acordo com as circunstâncias e valores de cada época – o maior expoente dessa escola foi o juiz William Brennan, voz dominante na Suprema Corte até o final dos anos 1980.
Por aqui, a preocupação com as circunstâncias e consequências das decisões sempre foi preponderante no Supremo. Ela esteve presente, ainda que em menor grau, mesmo nos votos dos três ministros que prefeririam tirar Renan da Presidência do Senado – o relator Marco Aurélio de Mello, Edson Fachin e Rosa Weber.
Foi tal preocupação que orientou o voto dos demais seis ministros pela permanência de Renan na Presidência do Senado. Eles preferiram evitar ampliar o conflito entre Judiciário e Legislativo. Tomaram uma decisão eminentemente política e, num lance criativo de leitura da lei, um “jeitinho jurídico”, lançaram panos quentes sobre a ferida que se abria.
Os ministros até repreenderam Renan e os demais integrantes da mesa do Senado que desafiaram a ordem judicial expressa na liminar emitida na véspera por Marco Aurélio. Mas nada determinaram como sanção. Ninguém foi punido por mentir ao oficial de justiça ou por deixá-lo esperando sem assinar a notificação.
Eles apenas engoliram em seco, tamanha era a preocupação em evitar o confronto institucional. Na aparência e nos comunicados públicos, a crise entre Judiciário e Legislativo foi superada. Na realidade, os fatores que a geraram continuam presentes.
Renan ainda é réu. Ele continua a ser investigado numa dúzia de inquéritos. É acusado de ter recebido R$ 32 milhões de propinas desviadas da Petrobras e de ser um dos maiores beneficiários do petrolão. Tem um histórico contumaz de desviar de denúncias e escândalos, com seu estilo discreto e matreiro. Continua a ser um competente operador de bastidores.
Adiou, por ora, os planos de pôr em votação a lei sobre abuso de autoridades que, embora necessária, não passava de uma manobra para tentar deter o avanço da Operação Lava Jato. Mas continuará a manter essa arma ao alcance da mão, pelo menos enquanto ocupar a presidência do Senado. Na outra mão, empunha a ameaça de novas leis de remuneração para o Judiciário.
Com a eleição de um novo presidente do Senado, prevista para o início do ano que vem, é provável que ele perca parte de seu poder. Até lá, terá sido votada a Proposta de Emenda Constitucional que estabelece um teto para gastos públicos. Depois, os processos contra Renan avançarão. Sua queda pode ter sido apenas adiada.
É nisso que apostam os ministros que votaram por sua permanência no cargo. Pelo menos dois deles afirmaram, em seus votos, que o risco maior para o país era a interrupção da agenda legislativa, não a possibilidade de Renan ocupar a Presidência. Para quem mede as consequências, essa leitura pode fazer sentido.
Ela só esquece que, com aval da mais alta corte do país, hoje a presidência do Senado é ocupada por alguém que – réu por peculato, acusado de corrupção e investigado em 12 inquéritos – ainda teve a petulância de desafiar a Justiça. Como reagirá a população que foi às ruas no último domingo pedir a cabeça de Renan? Quem são os alvos óbvios nas próximas manifestações?
A principal dificuldade de interpretar a lei de acordo com a circustância política é que ninguém, nem mesmo os todo-poderosos ministros do STF, controla as consequências das decisões. Se a aposta deles era num clima de tranquilidade, o efeito pode muito bem ser o oposto.
Na tarde de ontem, o Supremo decidiu, por seis votos a três, que, na condição de réu sob a acusação de peculato, o presidente do Senado, Renan Calheiros, não poderá ocupar a Presidência da República – mas poderá continuar no cargo. Pela decisão de ontem, em caso de ausência do presidente Michel Temer e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o artigo 80 não será cumprido.
O Supremo pode ordenar que um artigo da Constituição não seja cumprido? Como tribunal constitucional, o STF interpreta a lei como entende melhor. A interpretação de ontem se baseou não no que está escrito, mas no juízo subjetivo sobre as consequências da decisão.
A escola jurídica conhecida como "originalista" acredita ser papel da mais alta corte decidir com base no que está literalmente escrito na Constituição. Nos Estados Unidos, o maior expoente dessa escola em tempos recentes foi o juiz Antonin Scalia, morto este ano. Lá, originalistas tiveram papel determinante em casos cruciais, como o direito ao porte de armas ou o financiamento de empresas a campanhas eleitoriais.
Nos Estados Unidos, opõe-se ao orginalismo a noção de uma “Constituição viva”, interpretada de acordo com as circunstâncias e valores de cada época – o maior expoente dessa escola foi o juiz William Brennan, voz dominante na Suprema Corte até o final dos anos 1980.
Por aqui, a preocupação com as circunstâncias e consequências das decisões sempre foi preponderante no Supremo. Ela esteve presente, ainda que em menor grau, mesmo nos votos dos três ministros que prefeririam tirar Renan da Presidência do Senado – o relator Marco Aurélio de Mello, Edson Fachin e Rosa Weber.
Foi tal preocupação que orientou o voto dos demais seis ministros pela permanência de Renan na Presidência do Senado. Eles preferiram evitar ampliar o conflito entre Judiciário e Legislativo. Tomaram uma decisão eminentemente política e, num lance criativo de leitura da lei, um “jeitinho jurídico”, lançaram panos quentes sobre a ferida que se abria.
Os ministros até repreenderam Renan e os demais integrantes da mesa do Senado que desafiaram a ordem judicial expressa na liminar emitida na véspera por Marco Aurélio. Mas nada determinaram como sanção. Ninguém foi punido por mentir ao oficial de justiça ou por deixá-lo esperando sem assinar a notificação.
Eles apenas engoliram em seco, tamanha era a preocupação em evitar o confronto institucional. Na aparência e nos comunicados públicos, a crise entre Judiciário e Legislativo foi superada. Na realidade, os fatores que a geraram continuam presentes.
Renan ainda é réu. Ele continua a ser investigado numa dúzia de inquéritos. É acusado de ter recebido R$ 32 milhões de propinas desviadas da Petrobras e de ser um dos maiores beneficiários do petrolão. Tem um histórico contumaz de desviar de denúncias e escândalos, com seu estilo discreto e matreiro. Continua a ser um competente operador de bastidores.
Adiou, por ora, os planos de pôr em votação a lei sobre abuso de autoridades que, embora necessária, não passava de uma manobra para tentar deter o avanço da Operação Lava Jato. Mas continuará a manter essa arma ao alcance da mão, pelo menos enquanto ocupar a presidência do Senado. Na outra mão, empunha a ameaça de novas leis de remuneração para o Judiciário.
Com a eleição de um novo presidente do Senado, prevista para o início do ano que vem, é provável que ele perca parte de seu poder. Até lá, terá sido votada a Proposta de Emenda Constitucional que estabelece um teto para gastos públicos. Depois, os processos contra Renan avançarão. Sua queda pode ter sido apenas adiada.
É nisso que apostam os ministros que votaram por sua permanência no cargo. Pelo menos dois deles afirmaram, em seus votos, que o risco maior para o país era a interrupção da agenda legislativa, não a possibilidade de Renan ocupar a Presidência. Para quem mede as consequências, essa leitura pode fazer sentido.
Ela só esquece que, com aval da mais alta corte do país, hoje a presidência do Senado é ocupada por alguém que – réu por peculato, acusado de corrupção e investigado em 12 inquéritos – ainda teve a petulância de desafiar a Justiça. Como reagirá a população que foi às ruas no último domingo pedir a cabeça de Renan? Quem são os alvos óbvios nas próximas manifestações?
A principal dificuldade de interpretar a lei de acordo com a circustância política é que ninguém, nem mesmo os todo-poderosos ministros do STF, controla as consequências das decisões. Se a aposta deles era num clima de tranquilidade, o efeito pode muito bem ser o oposto.
Meu Comentário: A frase "Façamos a revolução antes que o povo a faça", é atribuída ao ex-governador de Minas Gerais, Antonio Carlos. Ela foi dita no contexto da Revolução de 1930, que pôs fim ao período da República Velha e deu início ao período que ficou conhecido na história brasileira como "Era Vargas", que durou 15 anos.
O que eu penso é que o povo brasileiro não aguenta mais o notícia só falar em corrupção, e a assistir em menos de dois anos três novelas políticas: impeachment, Eduardo Cunha e agora Renan Calheiros. Acredito que a classe política nos distantes anos 30, tinham mais tato em relação ao seu momento histórico do que os políticos atuais. Deve-se tomar cuidado porque senão o temor da frase dita no início do comentário pode se tornar realidade. Deus nos ajude!
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