“Pastoreai o Rebanho
de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como
Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade; nem como dominadores
dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos do rebanho.” I Pedro 5:2-3
Uma observação e um conselho.
Há uma coisa que deveria ser pejorativamente
chamada de "espírito de pastor", e essa tal coisa é uma casta
existencial difícil de deixar a pessoa.
O fato é que há muita gente "possessa desse
espírito", o qual tira da pessoa a possibilidade de ser ela mesma, fazendo
dela um clone psicológico de um modo de sentir completamente artificial, e sem
espontaneidade humana com os outros e com a própria pessoa.
Geralmente começa com um jovem cheio de amor por
Jesus. Pregando em toda parte, pois só queria pregar. Há o desejo de ser pastor
e nem ordenado. E não há mal nisso, porque Paulo diz a Timóteo que quem deseja
o episcopado excelente coisa deseja (I Tim 3:1). Aí chega um dia em que essa
pessoa vocacionada é ordenada ao ministério pastoral.
Então,
logo começaram a chamar o novo ordenado de "Reverendo". Aquele garoto
livre, agora, de súbito, da noite para o dia, era o "pastor ou reverendo
fulado de tal". Aí o tratamento passa a mudar: O melhor lugar na casa, na
mesa, na sala, no salão, no aniversário, no funeral, nas festas de casamento,
nas bodas, etc. As pessoas começam a ver o "sacerdote", o homem
diferente dos homens, o santo, o ungido do Senhor, o anjo da igreja...; e
também se percebe que as pessoas mudam com você; mas raramente se percebe que
depois de um tempo, muito suave e lentamente, você também aceita a mudança que
fizeram acerca de você. Ora, é aí que nasce o "espírito de pastor"!
Então, começa a transformação do ser humano numa
figura totêmica, um totem erguido para a manutenção de tudo: Ele é santo pelos
outros; é puro pelos demais; é quem não se diverte pelos que se divertem; é
quem não fica doente para poder curar; é quem "estuda Deus" e
"entende de Deus", a fim de poder explicar; e é quem é exemplo para
se fazer clones comunitários.
Se
ele não casa os que se casam, eles se ressentem e magoam. Se ele está viajando
quando alguém morre, ele abandonou o moribundo. Se ele está de férias, a igreja
pode esvaziar. Ou seja: sem ele, nada do que foi feito de fez ou se faz!
Vivendo sob tais responsabilidades e honras, o indivíduo vai virando pajé e não
sente. Ou, em muitas ocasiões, passa a gostar mesmo de ser essa figura
totemizada para a "igreja".
Ora,
é nesta necessidade que o povo tem de ter "sacerdotes" e
"figuras cultuadas", que tanto os bem intencionados se corrompem
entregando-se ao "espírito de pastor"; como também os lobos se
aproveitam e tiram as carnes do rebanho.
De
fato, os ministérios, pastoral, episcopal, apostólico ou de qualquer outra
natureza já carregam em si próprios o germe do poder desse imantamento
espiritual. As pessoas olham para qualquer desses "seres" —
"ungidos" formalmente para tais posições —, como "ungidos do
Senhor"; aqueles contra os quais não se pode ter uma opinião, pois, em
assim sendo, Deus mesmo punirá os "rebeldes", ou "hereges",
ou "desviados". Imagine quanto poder isto significa!
Ali
está um homem que é visto como "o homem de Deus" no meio dos demais
homens "normais", e, de tal projeção, pode nascer apenas o
"pastor clerical", como também pode vingar qualquer maluquice!
O clericalismo pode fazer mal em relação à saúde
do indivíduo que carrega o peso cultural dessa "posição".
E a comunidade também fica adoecida! Sim, porque
enquanto ela vê o líder com tais olhos, ela não cresce; ao contrário, se
infantiliza; e jamais aprende a andar com as próprias pernas.
Ora, o verdadeiro pastor cuida, não domina;
ajuda, não controla; alimenta, não explora; só se faz notado em caso
absolutamente necessário; e deixa a porta aberta, de tal modo que todos entram
e saem e acham pastagem.
A analogia do Bom Pastor em João 10, todavia, é
perfeita no seu todo apenas em relação a Jesus, e a mais ninguém. Isto porque
em relação a Jesus todos nós somos apenas ovelhas do rebanho.
Porém, em relação a nenhum "outro
pastor", nós devemos ser "ovelhas do rebanho"; posto que ser
ovelha de Jesus já nos põe na condição de só ouvir a voz de um homem se ela for
de acordo com a Voz do Único Pastor; do contrário, a ordem de Jesus é para não
"seguir a voz do estranho", pois somos o Rebanho de Deus.
Portanto, o verdadeiro pastor de homens é apenas
mais um do rebanho único, sendo somente uma ovelha que já se deixou ensinar um
pouco mais pela voz do Único Pastor. É na Sua fidelidade e reconhecimento à Voz
do Pastor que ele se qualifica para ser pastor entre ovelhas, pois, conforme
Pedro, ele se torna "modelo do rebanho".
Assim, é o caminho da ovelha seguindo o Pastor,
o que a torna uma ovelha-pastor; visto que seu passo e obediência estabelecem
referência para as demais.
O problema é que alguns "pastores" e
clérigos pensam que são os "Jesuses" da comunidade; e, diferentemente
de Jesus, transformam-se nos lobos que não amam as ovelhas, mas apenas os
privilégios e poderes que delas "arrancam".
E
como agravante, a "igreja", por muitas vezes ainda ter uma
mentalidade pagã em sua essência, precisa desses "pastores tiranos",
pois, como associam a "figura clerical" ao "representante de
Deus", sentem-se mais seguras se têm um déspota dizendo o que fazer, o que
não fazer, com quem casar ou não, e quem é quem.
"Não é assim entre vós!" — disse
Jesus!
Foi por esta razão que Jesus tirou as roupas de
cima e se cingiu de uma toalha e passou a lavar os pés dos discípulos. Sim,
porque liderar é, sobretudo, poder lavar pés e servir em nudez.
Na
realidade, além de tudo o que o gesto de Jesus ensina, nele também vemos o modelo
existencial do significado da liderança: O líder serve em revelação de sua
humanidade. E os liderados são servidos aceitando a humanidade de quem lidera
servindo de modo humano. E Jesus disse a Pedro que ou seria assim, ou Pedro não
teria parte com Ele!
Somente quando os líderes tiverem a coragem de
fazer como Paulo e Barnabé, que rasgaram as roupas e expuseram sua nudez quando
foram chamados de "deuses", é que aqueles que crerem no que as
lideranças disserem, não ficarão ainda mais adoecidos de idolatria.
Hoje
se dá o contrário da experiência dos apóstolos: a maioria dos líderes faz todo
o possível para passar por deuses; e, o povo, vai se ameninando na fé, apenas
trocando de "pai-de-santo", ou de pajé ou de sacerdote; porém
existindo sob a escravidão da espiritualidade da idolatria; adorando e servindo
a criatura, mesmo que se vistam de pastores, bispos ou apóstolos.
A gente tem que buscar diante de Deus e conforme
o Evangelho, quebrar todos esses paradigmas totêmicos. Sugiro que todos, em
todo lugar, e com todo bom coração, assim o façam também, em nome de Jesus, o
Bom Pastor!
Excelente estudo. Que o Espírito Santo continue te abençoando e lhe dando discernimento Pr. Juber.
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