Perigos que rondam a integridade e a ética do pastor parecem mais intensos do que nunca. “Foi um momento de fraqueza dor e curiosidade doentia”. Com essas palavras, o pastor reformado Robert Charles Sproul Jr., da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos, admitiu ter visitado o site de relacionamentos Ashley Madison, voltado para pessoas casadas que procuram um caso. O caso do pastor veio à tona em agosto, quando um grupo de hackers autointitulado Impac Team violou o sigilo do site e obtiveram quase 25 gygabites de informações sigilosas sobre milhões de cadastrados e freqüentadores eventuais do Ashley Madison, cujo slogam – “A vida é curta; curta um caso” – faz sucesso também aqui no Brasil, onde é um dos 150 sites mais acessados pelos internautas.
Sproul Jr, de 50 anos, foi imediatamente afastado do Ministério Ligonier, organização cristã internacional de linha reformada e conservadora fundada por seu pai, o respeitado pastor RC Sproul, que ainda integra o Conselho da entidade. Um dos temas centrais da pregação do Ligonier e, justamente, a santidade do cristão. Mas Sproul Jr. Disse que caiu na tentação de “atiçar as chamas da sua imaginação”.
E o escândalo envolvendo o líder evangélico pode ser só a ponto de um iceberg, já que os hackers que se apoderaram dos dados ameaçam vazar listas de milhões de iformações pessoais e revelações íntimas dos usuários, inclusive “perfis com fantasias secretas dos clientes”, se o site não for retirado do ar. Especula-se que outros 400 líderes evangélicos estariam apavorados com a quebra de sigilo do “site dos adúlteros”.
Em Junho, evangélicos de todo o mundo já haviam sofrido o choque com a notícia de que o pastor e conferencista Tulian Tchividjian afastou-se da congregação que dirigia, a Igreja Presbiteriana Coral Ridge, na Flórida. O motivo? Um escândalo sexual. O caso ganhou ainda mais repercussão por Tchividjan, embora não carregue o sobrenome, é neto do célebre evangelista Billy Graham, um dos mais respeitados líderes da história contemporânea da igreja. Do alto dos seus 96 anos, Billy Graham permanece como reserva ética e moral da fé cristã, sem jamais ter se envolvido em escândalos financeiros, desvios morais ou simples suspeitas quanto à sua integridade.
Melhor sorte não teve o neto que, admitiu ter se relacionado “inadequadamente” com uma amiga após descobrir que a mulher, Kim, também tivera um caso extraconjugual. Pregador carismático, e com fama florescente, Tchividjan, aos 42 anos, tem agora de enfrentar o difícil – e nem sempre possível – caminho da restauração pessoal, familiar e ministerial. A última informação é que, ele deu entrada no divórcio no dia 27 de agosto.
Nos dois pastores citados (Sproul Jr. e Tchividjian) não faltaram boas influências. Porém, nem todo pastor consegue conviver com condições de estrelato sem se deixar picar pela mosca azul. Mark Driscoll, queridinho dos neo-reformados, caiu na armadilha do ego. Palestrante requisitado e figurinha constante de programas de TV e entrevistas, chegou àquele perigoso ponto que um líder já se sente forte o bastante para não dar satisfações.
Ele desagradou seus subordinados na Igreja Mars Hills, em Seattle (EUA), pelo excesso de autoritarismo e acabou sendo afastado do comando no ano passado. Os outros pastores se queixaram de prestação de contas insuficientes de contas em Mars Hills, uma igreja com quase 15 mil membros e presença em cinco estados americanos. Segundo eles, “o poder se consolidou no topo com Driscoll”, que tinha “rédea livre” para fazer o que queria. Agora, Driscoll tem dito que precisa voltar a ser “gente comum” e repensar a vida e a vocação.
Fatos como esses tem ocorrido em vários países, e não é diferente no Brasil, mas pergunta que fica é : por quê ocorre?
O pastor Jasiel Botelho, palestrante na área de famíla e ministério, lembra que, via de regra, apenas pecados na área sexual chamam a atenção quando cometidos por um pregador da Palavra de Deus. “Hoje, eu creio que a maior tentação ministerial é ter uma grande igreja”, assevera Botelho, que é fundador e presidente da missão Jovens da Verdade. No seu entender, a coisa funciona mais ou menos da seguinte maneira: “Se tenho uma igreja com milhares de membros, sou relevante e serei convidado para os congressos nacionais e internacionais, adquirindo poder financeiro e influência política”.
Para ele, as prioridades dos pastores mudaram muito. “Antes, considerávamos o ministério na mais alta conta. Hoje, ele vem atrás de muita coisa, inclusive métodos de crescimento da igreja”.
“Apesar de viver rodeado de ovelhas, o pastor é um ser solitário; não tem amigos, só tem colegas de ministério e concorrentes ao cargo pastoral. Pastores necessitam uns dos outros, isto é, precisamos de mentoria”, concorda o escritor e conferencista Geremias do Couto, pastor da Assembléia de Deus. “Por força do pastoreio, ouvimos muito, mas não temos a quem expressar as nossas fragilidades, até por falta de confiança”.
Embora o sistema eclesiástico de cada denominação trate- ou deixe de tratar - a questão à sua maneira, Couto acredita que, em sua expressão local, o pastor deveria ter um grupo de apoio para estar ao seu lado e sustentá-lo em todas as circunstâncias. Apesar de fazer mea culpa, admitindo que a classe, em regra geral, acha que não precisa disso, ele critica a falta de iniciativa da sua e de outras denominações. "A meu ver, muito pouco, ou nada mesmo, se faz nesse sentido. Há um projeto interdenominacioanal chamado Pastores de Pastores, que poderia servir como modelo para as igrejas. É basicamente um sistema em que os pastores se reúnem para serem pastoreados, orarem juntos e compartilharem suas experiências, fragilidades e em que áreas necessitam de suporte".
Fonte: Trechos da matéria "Sombras no Púlpito", da edição nº 48 da Revista Cristianismo Hoje.
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