A intolerância religiosa tem de ser tão antiga quanto a própria idéia de religião, mas é duvidoso mérito dos cristãos (e a partir de agora usa a palavra na pior acepção do termo, e também a única) ter refinado o conceito associando a alternativa à escravidão, à tortura e à morte em larga escala. O cristianismo foi a primeira religião da história a ganhar verdadeiro peso cultural através da conversão.
O cristianismo histórico foi desde o início, exatamente como nos nossos dias, empreendimento de curto prazo, indústria de resultados.
Jesus passou de ilustre desconhecido a único Deus do vertiginoso Império Romano em meros 300 anos – menos que um piscar de olhos em termos históricos. Não é de estranhar que pelo menos metade dessa conversão nominal do mundo tenha sido adquirida na ponta da espada. A fim de salvar os incréus era necessário não tolerar a sacrílega religião deles: os cristãos entenderam o imediatismo do Ide e saíram pelo mundo fazendo inimigos, ostracizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito.
Essa dupla paixão pelos resultados e paixão pela publicidade deixam claro que o cristianismo histórico não é o menos eloqüente antecessor do convulsivo capitalismo contemporâneo.
Essa implacável visão de mundo, da expansão númerica e comercial como missão divina, determinou toda a história do ocidente, inclusive a sangrenta colonização das Américas. Em 1454 o Papa Nicolau V resume essa postura geral na sua Bula Romanus Pontifex, em que concede ao rei Afonso de Portugal (e a seu príncipe D. Henrique, que daria forma final à nau oceânica portuguesa e assim o chute inicial às Grandes Navegações), uma singela série de privilégios materiais associados à sua pureza de coração:
“(...) concedemos ao dito rei Afonso a plena e livre faculdade, entre outras,
de invadir, conquistar e subjugar quaisquer sarracenos e pagãos, inimigos
de Cristo, suas terras e bens, a todos reduzir à servidão e tudo aplicar em
utilidade própria e dos seus descendentes (...)”
P R I M E I R O P A S S O
Viva a intolerância contra os religiosos
Nenhuma manifestação do cristianismo institucional dos nossos dias difere, em qualquer sentido importante, da inclinação geral do parágrafo acima. Os filhos do Rei permanecem reclamando seus direitos, absolutamente convencidos da primazia da sua condição. Os religiosos cristãos chafurdam em seus merecimentos, e oram descaradamente para extrair alguma prosperidade dos inimigos de Cristo ou reduzi-los à servidão – o que for mais imediato ou der mais prazer (e é naturalmente graças aos cristãos que cremos que essas duas últimas coisas andam juntas).
Por alguma razão que Cristo não teria como entender, os que se consideram cristãos são os mesmos que se consideram religiosos. E, dentro da mesma lógica ignorante dos fatos, os que não se submetem à religião são considerados inimigos de Cristo.
Talvez baste para você pensar e agir assim, mas se você quer ser de fato como Cristo é absolutamente necessário dar o primeiro e louquíssimo passo na direção de Deus e para longe da religião.
Porque Jesus, como deixam abundantemente claro os evangelhos, promovia e aplicava consistentemente uma forma muito particular de intolerância religiosa: a intolerância contra os religiosos. Jesus, que comia com estelionatários, bebia com agiotas e era amigão de prostitutas, tolerava aparentemente tudo em todos.
“Eu não condeno você”, ele ousou blasfemar aos ouvidos da mulher adúltera. O rabi puxava conversa com divorciadas promíscuas, pousava sua mão sobre leprosos de que todos desviavam o olhar e dormia nas camas rendadas de inimigos do povo. O sujeito conseguiu o feito inédito de sustentar a fama de homem de Deus ao mesmo tempo em que abraçava os puxadores de fumo, traficantes, travestis e aidéticos do seu tempo.
Mas havia um limite para a sacanagem que ele podia engolir. A única classe de pessoas que fazia Jesus perder a paciência e a compostura era, formidavelmente, a dos religiosos. Aquele que mostrou-se disposto a acolher sem qualquer transição um criminoso no seu paraíso não tinha uma única palavra de tolerância para os devotos, os carolas, os piedosos, os santinhos. Esses despertavam a sua ira, e para ser como Jesus é necessário – sinto dizer – que despertem também a sua.
Para demonstrar de forma conveniente a implacável intolerância de Jesus para com os religiosos seriam necessários quatro evangelhos. Deve bastar, no entanto, o relato da homérica lavada que levou um fariseu imprudente que convidou Jesus para jantar.
É preciso ainda ressaltar que a religiosa intolerância de Jesus para com os religiosos em nenhum momento esteve voltada para o que chamaríamos mais tarde de pagãos. A Jerusalém do tempo de Jesus era cidade ocupada pelos romanos, apinhada de sacrílegos templos, estátuas, estádios, quartéis, teatros e banhos públicos que os judeus piedosos só faziam condenar. Incrivelmente, não chegou até nós nenhuma palavra de condenação de Jesus contra essas barbaridades; pelo contrário, que Jesus estava favoravelmente familiarizado com a cultura romana fica claro, por exemplo, no uso natural e muito apropriado que ele faz do termo hipócrita (ator, mascarado, canastrão), emprestado do teatro, forma de arte que os judeus de boa estirpe ao mesmo tempo desconheciam e abominavam.
O desconcertante é que, ao mesmo tempo em que tolerava os pagãos, Jesus batia de frente contra os que afirmavam terem o monopólio de acesso ao Verdadeiro Deus. Jesus reconhecia que o vasto e inclassificável Deus das escrituras hebraicas era também o seu, mas ao mesmo tempo asseverava que os sacerdotes, fariseus e intérpretes que pretendiam tê-lo seqüestrado para si, fechando-o dentro de um sistema religioso estanque, confortável e opressor, não tinham a mínima idéia de com quem e de quem estavam falando.
O primeiro passo para fazer no nosso tempo o que Jesus fez no seu é, incrivelmente, abrir mão de qualquer palavra de condenação contra os ateus, os feiticeiros, os satanistas, os liberais, os wiccans, os macumbeiros, os budistas, os hindus, os animistas – agnósticos e pagãos de todos os matizes. O alvo da nossa intolerância deve ser outro, o alvo que foi também o de Jesus: os que passeiam pelo mundo crendo ter o aval inequívoco e a credencial indelével do Verdadeiro Deus. Aqueles que, nas palavras de Paulo, estão persuadidos de serem “guias dos cegos, luz dos que se encontram em trevas, instrutores de ignorantes, mestres de crianças, tendo na lei a forma da sabedoria e da verdade” – mas que “ensinam os outros sem ensinarem a si mesmos”.
Quando apenas esses nos fizerem perder toda a paciência e a compostura; quando apenas esses nos levarem a abrir a boca em imprecações e maldição, estaremos sendo como Jesus.
Fonte: Em seis passos o que faria Jesus - Paulo Brabo, pgs. 2 a 5.
Graça e Paz, amado Pr. Juber!
ResponderExcluirRealmente, o único grupo de pessoas que Jesus se insurgiu foi justamente contra os religiosos que se achavam justos e desprezavam os outros. Os detentores da "verdade", eram o alvo das condenações de Jesus. Isto está muito claro nos Evangelhos. Quem lê, entenda.
Um abração!
Marcos Wandré,
ResponderExcluirHavia sérios problemas políticos e sociais nos dias de Jesus. No entanto, ele ocupa seus anos de ministério, ensinando, pregando e curando o povo. Sua única crítica a um político, foi quando chamou Herodes, de "raposa". A cultura grego/romana era a dominante em sua época, onde há relatos históricos de orgia, bacanais, homossexualismo, principalmente na elite romana. Mas Jesus não fez passeata de protesto em Jerusalém, Cesaréia ou Roma. Lendo os evangelhos e transpondo para os dias de hoje, não vejo Jesus participando da "Marcha para Jesus" e nem na porta do Congresso Nacional, contra alguma lei que porventura traga incômodo aos evangélicos. Os fariseus modernos tentam distorcer o texto de Mateus 23, dizendo que ele só se aplicava aos líderes religiosos judeus. Vejam só! O texto tinha aplicação imediata, mas também futura, para aqueles que se acham "donos" da verdade, que fecham a porta do reino dos céus, de sorte, nem eles entram, nem deixam os outros entrarem. Vou ficando por aqui, depois falo mais.
Grande abraço.
Juber mano, paz!
ResponderExcluirAmado, esse texto veio em uma excelente hora, haja vista o período de certa tribulação que ando vivendo na blogosfera, com uns "donos da verdade" que o texto fala.Usei também sua respota ao Marcos no final do texto, bem como deixei meu comentário a respeito desse período de turbulência.Se puder de uma olhada no meu blog agradeceria e, se acrescentasse mais algum comentário, ficaria muito feliz.
Pastor, fiquei muito feliz quando encontrei com o Caio e ficarei imensamente feliz de conhecê-lo um dia para juntos nos regozijar no Senhor. Deus ainda me dará essa oportunidade.
Um beijo em seu coração.
Ednelson,
ResponderExcluirEu sei, o que é isso. Tanto que cheguei a pensar que se fosse para entrar nessa onda de baixaria que eu vejo por aí na blogosfera, eu preferia fechar o blog. Mas não vou fazer isso. Esses "pedrinhas" que me atacaram, não são suficientes para me fazer parar. Fico triste é claro, por ver que nem entre os que eles chamam de "impios" se viu tal coisa, tão desalmada e desleal. Fique à vontade para postar o texto do Brabo e o meu comentário. Vou dar uma passada por lá com certeza.
Abraço.
Pastor Juber,
ResponderExcluirEsse assunto muitas vezes gera polêmica, pois muitos usam o pretexto de dizer que a igreja precisa se manifestar sobre tudo o que se passa no cenário político e social de uma nação, mas nós realmente não vemos Jesus envolvido nisso.
Jesus estava voltado para sua missão e hoje em dia, penso que a missão maior da igreja é a salvação das pessoas. Que a igreja pode lutar por seus direitos tudo bem, somos também cidadãos, mas nem sempre precisamos tentar aprovar cartas leis ou não ou manifestações ou não, creio que nossa obra é outra. Podemos até agirmos como cidadãos, mas jamais trocar nossa missão por coisas que acontecem no País.
Deus abençoe!
Matias,
ResponderExcluirTenho uma opinião semelhante a sua. A gente vê hoje, muitas vezes a igreja, deixando sua missão primordial, para se dedicar mais a atividades secundárias. Pastores que em vez de atuarem como pastores das ovelhas, no trato, no conselho, na palavra, estão mais para executores de programas, gestão empresarial entre outras coisas.
Abração e obrigado pela participação.
Acho esse texto lamentável sob vários aspectos, e tenho a intenção de, um dia, se tiver tempo, questionar com mais detalhamento frases irresponsáveis como essa: "O cristianismo histórico foi desde o início, exatamente como nos nossos dias, empreendimento de curto prazo, indústria de resultados." O que me traz grande desconforto é ver que o autor generaliza "o cristianismo", e faz isso com frequência, basta ver outros textos dele. Ele aplica sua teoria desconstrutivista a todos os cristãos, inclusive aos que sofreram, aos que deixaram tudo para Cristo, aos que deram suas vidas - coisa que ele nunca fez e provavelmente nunca fará - para seguir a Jesus, reduzindo ao pó todo manifestação cristã.
ResponderExcluirAcho risível ver este texto publicado aqui e creio que vc, Juber, deveria ser sincero e coerente com suas últimas postagens e deixar muito do que diz fazer parte, para seguir a esse cristianismo descompromissado e "livre" que o autor, irresponsavelmente, proclama de sua poltrona.
O grande problema, ao se proclamar "verdades" repisadas em bom vocabulário clichê, com o a pérola do lugar-comum "Não é de estranhar que pelo menos metade dessa conversão nominal do mundo tenha sido adquirida na ponta da espada." é a generalização que este senhor faz, como sempre faz, aliás, julgando todos por seu critério de "boa-gentismo" e santidade fichue. Para isso, basta ler outros textos em seu blog, além desse esquálido "em 6 passos o que faria jesus", paródia do brilhante "Em seus passos, o que faria Jesus?"
O mais incrível é que ele inaugura, ele mesmo como guru de uma geração de entusiastas do "pecado santo", a temporada da caça aos cristãos, por motivos considerados válidos e por outros, nem tão válidos assim. Ele inaugura o repúdio à igreja - a qualquer igreja, mesmo à que é a reunião dos santos em todo o mundo, e que nada tem a ver com a instituição que muitas vezes é, sim, maléfica, mas muitas vezes é, sim, benéfica. Ele inaugura o Jesus intolerante, coisa nova para mim: "Aquele que mostrou-se disposto a acolher sem qualquer transição um criminoso no seu paraíso não tinha uma única palavra de tolerância para os
devotos, os carolas, os piedosos, os santinhos. " Não foi Jesus quem, olhando os religiosos que o insultavam, do alto da cruz, orou ao Pai para que tivesse piedade deles, pois não sabiam o que faziam? Que explicou com tolerância e amor, ao rico religioso, que era necessário nascer de novo? O problema do autor não é com os religiosos, é com o próprio Jesus, e consigo agora ver com mais clareza isso."O primeiro passo para fazer no nosso tempo o que Jesus fez no seu é, incrivelmente, abrir mão de qualquer palavra de condenação contra os ateus, os feiticeiros, os satanistas, os liberais, os wiccans, os macumbeiros, os budistas, os hindus, os animistas – agnósticos e pagãos de todos os matizes. O alvo da nossa intolerância deve ser outro, o alvo que foi também o de Jesus: os que passeiam pelo mundo
crendo ter o aval inequívoco e a credencial indelével do Verdadeiro Deus. " Sim, vamos então aprovar, "incrivelmente", o satanismo, vamos também (para sorte do autor) aprovar o comportamento homossexual, enfim, tudo o que é mau, e somente abrir nossa boquinha pura para, em seis passos - poucos, para ninguém se cansar - imaginar o que faria Jesus contra os hipócritas religiosos. O autor, mais uma vez, consegue confundir o pecado, o comportamento que deve ser abandonado ("Vá, e não peques mais") com o pecador ("Eu não te condeno"). Por essa ótica, nada mais é condenável: pedofilia, homossexualismo, satanismo, espiritismo. Para que proclamar que só há um caminho, e que esse caminho é estreito? Afinal, os cristãos não seriam todos religiosos hipócritas?
Bom, teria mais a observar, mas também tenho mais o que fazer. Imagino que os libertários cheios de amor devem criticar meu comentário, é claro, afinal eu sou da "crentolândia", sou "intolerante", enquanto eles são da libertinândia, a capital da tolerândia.
Mas, Juber, creio que este deve ser meu último comentário em seu blog.
Um abraço,
Maya,
ResponderExcluirVocê acha o texto lamentável? Bem eu não acho. Mas minha resposta a você está no post da matéria sobre o Lula.
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ResponderExcluirMuito bom o texto!
ResponderExcluirNão sou cristão nem sigo religião alguma. Também não me considero ateu. Sou uma espécie do que se poderia chamar de agnóstico. Ontem estava com um amigo evangélico meu e debatíamos sobre religião. Na verdade, me calei pois os cristãos estão certo e para qualquer crítica a sua crença existe um remendo apropriado ou tomado de empréstimo. Me calei e só escutei. Ele que em suas palavras conhece a Deus disse-me que irei para o inferno se não aceitar Jesus como meu salvador...Mas minha realidade não é compatível com o mundo cristão. Considero um golpe baixo esse tipo de terrorismo psicológico que usam para nos abrir os olhos para a "verdade".
Renan,
ResponderExcluirObrigado pela sua visita e participação. Você é muito bem vindo por aqui, independe de como você se processa.
Queridos se Jesus condenou a religiosidade como voces dizem, por que ele cumpri todos os seus preceitos religioso?
ResponderExcluir1-Foi circunsidado ao 08 dias
2- Foi apresentado no templo
3- Foi ao templo aos 12 anos como todo menino judeu
4- Ao curar ao sego mandou este ofertar ao sacerdote
5- Deixou ser batizado por Joao Batista.
6- Se deixou ser conhecido como maior lider religioso de todos os tempos?
Religiao significa religado, Jesus se apresenta como esta religião na passagem da figueira e os ramos, Paulo afirma que Ele é o primogenito de toda criatua e que todas as coisas foram por ele reconciliadas!
Mas Jesus sempre condenou a hipocresia de quem ensina e cobra dos outros o que não vive, hipocritas, sepulcros caiados e outros adjetivos!
Jesus se insurgiu contra ainda o adulteros, feiticeiros, etc... mas ele nunca usou a palavra os religiosos entraram no reio dos céus, ele disse para os mentirosos!!
Porém nada causou maior dor ao mestre do que ver seu templo sendo feito lugar de comercio, algume aqui vende livros, cds ou cobra para pregar?
Eu sou religioso, fui religado a Deus por Cristo Jesus, o novo e vivo caminho!